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Por que o Brasil não tem o Nobel?

O presidente colombiano Juan Manuel Santos acaba de ser distinguido com o Prêmio Nobel da Paz. Ele foi reconhecido pelos seus esforços para pôr fim ao conflito que durou mais de 50 anos envolvendo grupos paramilitares, traficantes e guerrilheiros de esquerda, como as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e o Exército de Libertação Nacional (ELN), e que resultou em mais de 200 mil mortos.

Se o conflito efetivamente acabou só o tempo dirá, mas o segundo Prêmio Nobel concedido a um natural daquele país vizinho é certamente motivo de orgulho para o povo colombiano. Povo que deu rara demonstração de civilidade e solidariedade na tragédia aérea que abateu o time e comitiva da Chapecoense, incluindo 21 profissionais da imprensa.

O outro colombiano agraciado foi o inconteste Gabriel García Márquez, que em 1982 ganhou o Nobel de Literatura. Naquele ano ele já era o autor de obras-primas do realismo mágico da América Latina e da literatura universal, como “Relato de um náufrago”, “Ninguém escreve ao coronel”, “Cem anos de solidão”, “O outono do patriarca” e “Crônica de uma morte anunciada”, dentre outras.

“Agradeço à Academia de Letras da Suécia por haver me distinguido com um prêmio que me coloca junto a muitos dos que orientaram e enriqueceram meus anos de leitor e de celebrante cotidiano deste delírio sem remédio e que é o ofício de escrever. Seus nomes e suas obras se apresentam hoje para mim como sombras tutelares, mas também com o compromisso, frequentemente sufocante, que se adquire com esta honra”, disse então Gabo, num discurso político em defesa da liberdade na América Latina, mas reconhecendo a importância da premiação.

“Entendo que o prêmio que acabo de receber, com toda humildade, é a consoladora revelação de que meu intento não foi em vão”.

O Chile possui dois grandes da literatura também agraciados pela Academia de Letras da Suécia: os poetas Gabriela Mistral, em 1945, e Pablo Neruda, em 1971. A Argentina levou o prêmio nada menos que cinco vezes, inclusive duas vezes o Nobel da Paz, uma delas com Adolfo Pérez Esquivel, em 1980. O imenso Jorge Luís Borges, ao contrário do que muitos supõem, não foi reconhecido pela academia sueca.

O México foi agraciado três vezes, inclusive com o Nobel da Paz (Alfonso García Robles, 1982) e o de Literatura (Octavio Paz, 1990). A pequena Guatemala ganhou duas vezes (Rigoberta Menchú, Paz, 1992, e Miguel Ángel Asturias, Literatura, 1967). Também ganharam o Peru (Mario Vargas Llosa, Literatura, 2010), Trindade e Tobago (V. S. Naipaul, Literatura, 2001) e a Venezuela (um prêmio de Medicina, 1980).

Não cabe aqui relacionar as mais de 350 vezes que os norte-americanos ganharam ou as 120 vezes que os agraciados foram britânicos. E nem discutir o caráter político da premiação, até porque há quem conteste também algumas premiações que teriam sido claramente antiamericanas.

O que chama a atenção para nós brasileiros é que ninguém nascido neste triste país tropical jamais venceu o tão cobiçado troféu, que hoje garante uma bolsa nada desprezível de 1,2 milhão de dólares.

O brasileiro que mais chegou perto foi Jorge Amado. Dizem que entre os anos 1970 e 1980, no auge da sua fama internacional, seu nome foi cogitado algumas vezes pela Academia Sueca e que, em 1988, Jorge Amado teria perdido o prêmio de Literatura, por apenas dois votos, para Nagib Mahfouz, o primeiro escritor de língua árabe a receber o Nobel.

“Que outro prêmio pode querer um escritor cuja obra é lida em mais de 30 idiomas?”, dizia o baiano, dando de ombros para os critérios obscuros dos suecos.

Em 2010, cogitou-se da possibilidade do presidente Lula receber o Nobel da Paz. O norueguês Stein Tonnesson, diretor do Instituto Internacional para a Investigação da Paz, chegou a confirmar a informação de que seria muito provável a vitória de um político sul-americano que luta contra as desigualdades sociais. Mas não deu.

Os físicos Cesar Lattes e Mario Schenberg, os poetas Carlos Drummond de Andrade e Jorge de Lima, o economista Celso Furtado, o médico Carlos Chagas e o cardeal Paulo Evaristo Arns, em momentos e por motivos diferentes, chegaram mais ou menos próximos do prêmio. Mas no máximo batemos na trave.

Com tantos talentos, por que será que continuamos “invictos” num prêmio que desde 1901 já prestigiou uns 800 profissionais de mais de 70 países? No caso da literatura, há quem diga que falta aos escritores brasileiros “pluralidade de perspectivas sociais”, já que quase sempre estão focados no próprio mundinho.

E os nossos cientistas, por que não conseguem pôr a mão no título que um dia Albert Einstein conquistou? Seriam menos talentosos, por exemplo, do que os da África do Sul? Aquele país de língua inglesa já ganhou o Nobel 10 vezes, sendo três vezes na medicina, uma vez na química, além de duas vezes na literatura e em três oportunidades ganhou o Nobel da Paz — uma delas, em 1993, dividida entre Nelson Mandela e Frederick de Klerk.

Seria a língua? E o que dizer dos chineses, cipriotas, albaneses, croatas, árabes e gregos? Seria a nossa desastrada educação? Falta de criatividade e sorte? Ou o nosso complexo de vira-latas? Há quem diga que os suecos olimpicamente nos discriminam. Mas essa não é uma explicação. Para nosso consolo, dizem que o mais injustiçado de todos até hoje foi Mahatma Gandhi, que poderia ter ganho o Nobel da Paz.

Insistamos, então. Quem sabe um dia..

* Marcos Cardoso é jornalista, autor de “Sempre aos Domingos: Antologia de textos jornalísticos”.

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