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Os 100 anos de Lourival Baptista

Jornalista Marcos Cardoso

Lourival Baptista foi um importante político sergipano que poderia ser lembrado pela habilidade e astúcia, pela popularidade e pela capacidade de realização, mas ficou marcado pela associação do seu nome ao regime militar. Ele soube tirar proveito da ditadura para crescer como homem público. Na linguagem popular atual, ele se deu bem. Mas a sua biografia não pode ser resumida a isso.

Baiano do quase vizinho município de Entre Rios, onde nasceu em 3 de outubro de 1915, Lourival chegou a Sergipe em 1943 para trabalhar como médico. Veio exercer sua profissão na Fábrica de Tecidos São Gonçalo, em São Cristóvão, a convite de Augusto do Prado Franco, da família proprietária da indústria, de quem tinha sido colega na Faculdade de Medicina da Bahia. Já chegou casado com dona Hildete Falcão Baptista, com quem teve quatro filhos.

Revelando-se hábil político, cativou um colégio eleitoral e, com o apoio do colega udenista, soube aproveitar os ventos favoráveis do fim da ditadura Vargas para eleger-se deputado estadual em 1946. Em 1950, elegeu-se prefeito de São Cristóvão e, em 1958, conquistou o primeiro de dois mandatos consecutivos de deputado federal. O golpe de 1964 lhe foi favorável.

Já escolado nas artes e nas artimanhas da política, em 1966 deu o seu próprio golpe de mestre. A sucessão estadual no ano de 1966 transcorria da forma como preceituava o Ato Institucional n° 2, ou seja, a Assembleia Legislativa de cada estado escolheria três nomes que seriam submetidos ao voto decisivo do presidente Humberto de Alencar Castello Branco. Na lista tríplice de Sergipe constavam os nomes do ex-governador Leandro Maynard Maciel, do ex-governador e então deputado federal Arnaldo Garcez e do empresário Augusto Franco, que até então não tinha ocupado cargo público.

A história nunca esclareceu os argumentos apresentados por Lourival Batista, mas ele conseguiu passar a perna nos três fortes candidatos, convencer o marechal presidente e acabar sendo ungido governador de Sergipe, cargo que ocupou a partir de 31 de janeiro de 1967, tendo como vice-governador o advogado e professor Manoel Cabral Machado. Dizem que o amigo Luiz Viana Filho, ministro de Castelo e que governou a Bahia no mesmo período, foi peça fundamental no convencimento do presidente. Naquele mesmo ano de 1966, Leandro foi eleito senador e Augusto Franco foi eleito pela primeira vez deputado federal, todos pela Arena, o partido oficial do governo.

Primeiro governador sergipano indicado pelo regime militar — os outros foram Paulo Barreto de Menezes, José Rollemberg Leite e Augusto Franco —, o que se sabe é que Lourival Baptista manteve uma relação muito próxima, que alguns consideram até de bajulação, com os militares. Enquanto durou o regime, é de conhecimento público os mimos que ele fazia às autoridades em Brasília, a quem levava com frequência presentes regionais típicos, como os sorvetes de mangaba da Cinelândia, a mais famosa sorveteria de Aracaju na época. Se teve relação direta com as arbitrariedades do regime militar é algo que a Comissão da Verdade pode esclarecer.

Mas graças a essa relação de proximidade e ao bom momento econômico vivido pelo Brasil no período, conseguiu fazer um governo operoso, realizador de obras importantes, como o Edifício Estado de Sergipe, uma espécie de centro administrativo que ficou conhecido com o nome de Maria Feliciana. Com 28 pavimentos, é até hoje o maior prédio construído no Estado e do alto do qual, diz a lenda, ele gostaria de avistar a sua querida São Cristóvão.

Construiu o estádio de futebol que ainda é a principal praça de esportes local — a inauguração no dia 9 de julho de 1969 contou com a Seleção Brasileira comandada por Pelé, que venceu a Seleção Sergipana por 8 a 2 —, a rodovia ligando a BR-101 a Lagarto e um teatro no bairro Getulio Vargas, todas essas obras batizadas com o seu nome. Também se chama Lourival Baptista um conjunto habitacional no bairro Capucho.

Além de construir casas, estradas e escolas, ele ampliou a presença da Chesf no Estado, criou o Distrito Industrial de Aracaju, trouxe um escritório da Petrobras para Sergipe e implantou o Tribunal de Contas do Estado, que a partir deste mês desenvolve uma programação em homenagem ao fundador, incluindo o lançamento de um livro, “Lourival Baptista: Pacificação e Desenvolvimento”. A Assembleia Legislativa, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal também farão homenagens. Nas palavras do historiador Ibarê Dantas, ele foi um “administrador operoso e conciliador”, tendo atuado em um contexto favorável.

Lourival governou até o dia 14 de maio de 1970, quando se afastou para disputar o Senado. Ocupou a câmara alta por três mandatos, de 1971 a 1994, sendo que o segundo mandato de senador não foi conquistado nas urnas, mas por indicação. Ele foi um dos senadores biônicos, parlamentares eleitos indiretamente por um Colégio Eleitoral por obra e graça do Pacote de Abril de 1977, que foi uma resposta dos militares ao resultado das eleições de 1974, quanto a grande maioria das vagas do Senado em disputa foi conquistada por políticos do MDB. Em Sergipe, o jovem médico Gilvan Rocha foi a surpresa que derrotou nas urnas o experiente Leandro Maciel.

Mas na eleição seguinte, de 1986, Lourival reelegeu-se para o último mandato de senador. No derradeiro pleito eleitoral que disputou, em 1994, perdeu a vaga para o petista José Eduardo Dutra. O velho político morreu em Brasília quase 19 anos depois, no dia 8 de março de 2013, aos 97 anos.

Nas palavras do então governador Marcelo Déda, foi um homem que ao longo de sua trajetória aportou contribuições para o desenvolvimento de Sergipe, “seja como médico de fábrica atendendo aos operários em São Cristóvão, no começo da sua carreira política, seja como senador que destacou-se pelo combate ao fumo, chamando a atenção da nação brasileira para as consequências nefastas do tabagismo para a saúde pública, seja no período quando governou o Estado e teve a oportunidade de edificar obras públicas que até hoje são utilizadas pelos sergipanos”.

Marcos Cardoso é jornalista, editor do Caderno Mercado do Jornal da Cidade, e autor de “Sempre aos Domingos: Antologia de textos jornalísticos.

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