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Por que não se importar com a política?

Por José Milton Galindo Ramos *

Nos tempos atuais, vimos a população abominar a política e os políticos. É muito comum ouvirmos dos cidadãos e cidadãs dizer que não querem saber de política, pois vive do seu sustento e não depende de nenhum político ou da política! Engana-se você, cidadão e cidadã, pois todos dependemos de forma direta ou indireta da política.

Nas democracias representativas, que é o modelo atual praticado em grande parte do mundo como também no Brasil, precisamente a partir de 1989 com a volta da redemocratização e do voto com eleição direta para todos os cargos, depois de passarmos 21 anos sob um regime ditatorial. Até hoje muitos insistem em um discurso negacionista de que o regime militar implantando no golpe de 1964, com a derrubada do governo João Goulart, não era ditadura. E era o que mesmo? Se não havia eleições direta para escolha pelo sufrágio universal do voto, dando a população o direito de escolher seus representantes.

Para quem é novo, naquela época os governadores eram indicados pelos generais que estavam no comando do país. O parlamento, apesar de eleições para câmara e o senado, tinha suas limitações sob pena de ter seu mandato cassado. Ou seja, a chamada liberdade de expressão que vemos tanto ser disseminada pelo atual governo que defende a liberdade de falar, xingar, incitar o ódio, a violência etc.; estes são os mesmos que defendem o AI 5, que foi um ato institucional criado pelo regime militar para perseguir os opositores do regime, oprimir, cassar mandatos de deputados e a restrição de vários direitos fundamentais.

Mas, o ponto principal que quero discutir é que a política interessa sim a todos nós. Portanto, para melhor aclarar o debate e esclarecer parte da sociedade, em especial aqueles que se negam a participar da política, não de forma direta, pois aí é opção de cada um se candidatar a um cargo elegível ou não se candidatar. Todavia, participar da vida política de sua comunidade, estado ou do governo central, isso é mais que uma obrigação, é um dever cívico! Através de suas escolhas sua vida pode melhorar ou piorar.

Não devemos nunca deixar que os maus escolham os maus, pois assim o fazendo, você estará abrindo mão de seus direitos no presente e no futuro, tanto seu, como de sua família e das gerações futuras.

Os bons sempre são maioria em qualquer sociedade civilizada, e são através dessas pessoas que sua vida pode mudar para melhor. Não quero ficar aqui só em teorias; porém de forma explanativa vou citar alguns exemplos para que cada leitor, cidadão e cidadã, faça uma reflexão.

Vamos começar pela nossa Constituição atual, promulgada em 1988 e a anterior a ela (de 1967/ 1969) da era militar.

Na constituição de 1967, aprovada pelo regime militar, se promoveu duas alterações importantes na política educacional brasileira, só que de forma negativa. Primeiro, desobrigou a União e os Estados a investirem um mínimo, alterando um dispositivo na Lei de Diretrizes e Bases da Educação,  aprovada em 1961. Na legislação anterior, aprovada no governo João Goulart, previa-se que a União tinha obrigação de investir no mínimo 12 % do Produto Interno Bruto (PIB) em educação e também obrigava estados e municípios a alocarem também 20% do orçamento na área da educação. Ou seja, estamos falando de um governo eleito democraticamente. No ano de 1970, em pleno auge do governo militar (ditadura), estudos mostram que o percentual aplicado na educação foi de apenas 7,6%; caindo para 4,31% em 1975 e 5% em 1978. Então, enquanto um governo eleito democraticamente estabelecia metas mínimas de gastos na educação, o governo militar reduziu drasticamente, afetando diretamente a educação de crianças e jovens, num tempo em que o país tinha um crescimento econômico a uma taxa média de 10 % ao ano, conforme estudos do Dieese.

Saímos de uma população de 93 milhões de pessoas em 1970 e chegamos na década de 1980 com 119 milhões, ou seja, em uma década a população cresceu 27%, todavia os investimentos na educação e saúde não cresceram na mesma proporção, ao contrário, diminuiu, como já mostrado acima.

Na Constituição de 1969, o regime através de uma emenda, previa em seu art. 176 que “respeitadas as disposições legais, o ensino é livre à iniciativa particular, a qual merecerá amparo técnico financeiro dos Poderes Públicos, inclusive mediante bolsa de estudos.”

Na constituição de 1967, foi alterada a estrutura de educação básica como obrigatória de 8 anos, ou seja, a única alteração positiva pois, isso é mais ou menos o modelo atual do ensino fundamental. Porém, essas alterações não surtiram efeitos na expansão de matrículas, em função da redução dos gastos aplicados na educação pelos governos militares. E esse fato foi mais grave ainda na região Nordeste, que como sempre é quem mais sofre.

Na década de 70, o transporte escolar gratuito não existia.  Dessa forma, poucas pessoas tinham condição de se deslocar para estudar na sede dos municípios, onde existia o ensino fundamental até a 8 série.

Eu, particularmente, nasci em um povoado e para se deslocar até a sede era necessário recursos próprios; e posso dizer que fui um privilegiado, pois meus pais valorizavam muito a educação e na época eram um dos poucos que podiam arcar com um custo dessa magnitude naquela época.

Estou retratando isto de modo particular, porque quero traçar um paralelo de meados da década de 60, 70 e 80; de sorte que, mais adiante, mostraremos os avanços que tivemos pós constituição de 1988.

A partir da chamada Constituição Cidadã de 1988, tivemos avanços significativos tanto na educação, como na saúde e em outras áreas, porém vamos falar mais da educação e saúde que é o que afeta diretamente a vida das pessoas.

Vamos discorrer sobre os artigos 6º e 7º; no 6º se trata sobre vários direitos. Já no 7º, se trata dos chamados direitos sociais dos trabalhadores urbanos e rurais. Porém, vamos nos ater mais ao artigo 6º.

Art.6º   São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Mas o legislador constituinte não parou por aí; ainda incluiu o Parágrafo único que diz:  Todo brasileiro em situação de vulnerabilidade social terá direito a uma renda básica familiar, garantida pelo poder público em programa permanente de transferência de renda, cujas normas e requisitos de acesso serão determinados em lei, observada a legislação fiscal e orçamentária        (Incluído pela Emenda Constitucional nº 114, de 2021).

Nos artigos 205 e 208, o legislador se preocupou em definir o direito de todos a educação e o dever do Estado para com a educação, mediante garantia ao educando em todas as etapas da educação, por meio de programas suplementares.

Vejamos o art. 208. em seu VII” atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas suplementares de material didático escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.         (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009)

Mais a frente nos deparamos com o art. 212, onde o legislador veio estabelecer uma obrigação da União, Estados e Municípios a aplicarem um percentual mínimo. Diferente da constituição de 1967, que desobrigou a União e Estados de aplicarem um percentual mínimo, como havia sido estabelecido na Lei de Diretrizes Básicas, aprovada no governo João Goulart, como já citado acima.

É de bom tom que façamos uma leitura do art. 208 “in verbis”: A União aplicará anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, Distrito Federal e Municípios, vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.

Assim sendo, podemos observar que houve um grande avanço na educação, porque o legislador constituinte foi incisivo e pragmático, como de fato é nossa constituição, pragmática e programática.

Em outros artigos, a constituição vai tratar da lei de Diretrizes Básicas da Educação, estabelecendo critérios para aplicação desses recursos mínimos do qual fala o art. 212.

No art.6º da atual Constituição, a mesma trata dos direitos também a saúde, educação e outros como veremos:  São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. Art.  com redação dada pelo artigo único da EC nº 90/2015

Nos artigos 196 a 200 da Constituição de 1988 o legislador tratou das políticas de saúde pública, estabelecendo a forma de financiamento do SUS, aplicação mínima de recursos, assim como fez na educação, também estabelecendo formas de rateio dos recursos da União vinculados à saúde destinados aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, objetivando de forma progressiva a redução das disparidades regionais.

No artigo 198, ele trata da saúde de forma regionalizada e mais a frente descentralizada:

Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes, logo no Parágrafo Segundo no qual foi estabelecido também os critérios de aplicação mínima de recursos na área da saúde, no âmbito de todos os entes:

  • 2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde, recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados sobre (incluído pela Emenda Constitucional nº 29) de 2000.

Este parágrafo remete a outros artigos assim como os artigos 155, 156, 157, 158 e 159 que define a repartição de impostos pertencentes a cada ente.

No Parágrafo 4º, foi criada a figura do Agente Comunitário de Saúde e de Agente de Combate às Endemias, coisa que não existia.

Parágrafo 4º. “Os gestores locais do Sistema Único de Saúde poderão admitir Agentes Comunitários de Saúde e Agentes de Combate às Endemias por meio de processo seletivo público, de acordo com a natureza e complexidade de suas atribuições e requisitos específicos para sua atuação. (incluído pela Emenda Constitucional nº 51, de 2006).

Já a Lei Complementar 141/2012 veio tratar dos percentuais mínimos a ser aplicados pelos Estados, Distrito Federal e Municípios.

Estados e Distrito Federal deverão aplicar o mínimo de 12 % (doze por cento) de suas receitas correntes, excluídas aí as provenientes de convênios;

Os Municípios têm obrigação de aplicar 15 % (quinze por cento);

Já a União, apesar de a Constituição estabelecer, depois foram feitas algumas alterações através de emendas à Constituição.

Emenda 86/2015 § 11. É obrigatória a execução orçamentária e financeira das programações a que se refere o § 9º deste artigo, em montante correspondente a 1,2% (um inteiro e dois décimos por cento) da receita corrente líquida realizada no exercício anterior, conforme os critérios para a execução equitativa da programação definidos na lei complementar prevista no § 9º do art. 165.

Aqui faço uma ressalva: esses percentuais deverão ser obedecidos por toda a administração, sob pena de seus gestores responderem por crime de responsabilidade e terem suas contas rejeitadas pelos órgãos de controle.

Em suma, esses foram os avanços alcançados pós constituição de 1988, ou seja, na redemocratização do País. Se alcançamos estes objetivos, foi por que os políticos os quais elegemos, foram capazes de elaborar uma nova Constituição, e posteriormente outras leis infra constitucionais, que vieram efetivar os direitos consagrados na Constituição.

Portanto, como você cidadão ou cidadã, em pleno gozo de seus direitos políticos, tanto ativo como passivo, em curtas palavras, podendo votar ou ser votado, diz que não quer saber de política? Isso são políticas públicas que em sua grande maioria beneficia a toda população, em especial as classes menos favorecidas que dependem da mão amiga do Estado.

Não podemos deixar de falar dos avanços e do empoderamento que foi dado ao Ministério Público, todavia, vale ressalvar os abusos por parte de alguns membros, uma pequena minoria que tem se dado a alguns episódios, de forma midiática. Mas, no geral, têm atuado de forma sistemática e eficiente, na fiscalização e cobrança dos entes estatais. O que seria da sociedade sem esse órgão de controle! A meu sentir, seria um caos, no qual os chefes políticos usurpariam dos direitos dos cidadãos, usando do seu poder político.

Apesar da morosidade do judiciário, também houve grandes avanços para a sociedade; é evidente que precisa melhorar muito ainda. Porém, não podemos desprezar este outro órgão, em especial o STF que representa todo o judiciário e que traz segurança jurídica, apesar do ativismo judicial por parte de alguns poucos membros.

Até agora, falamos de aspectos e dos avanços das políticas sociais públicas, todavia, não podemos deixar de nos ater a outros problemas que afligem e tocam diretamente na vida da classe trabalhadora.

A política econômica de um governo diz muito, pois até meados da década de 90, vivíamos em um país com uma inflação desenfreada, que corroía o salário do trabalhador, onde tivemos período em que a inflação chegou a 80% por cento em um único mês. Imagine, que hoje falamos de uma inflação nos últimos 2 anos de 10% ao ano e 12% nos últimos 12 meses do ano. Trocando em miúdos, o trabalhador ou assalariado que tinha um salário de 1 mil reais em moeda de hoje, no final do mês esse 1 mil só valia 200 reais, ou seja, seu poder de compra era corroído pela inflação e quem mais sofria era o assalariado que não tinha seu salário reajustado. Falo isso, por experiência própria, pois nesse período era trabalhador assalariado.

Nesse período, tivemos o Plano Cruzado, Plano Cruzado II, Plano Bresser, isso no governo Sarney. Depois, tivemos o Plano Collor que foi mais devastador ainda, pois além de não controlar a inflação, ainda confiscou a poupança dos menos afortunados. Os grandes sofriam e sofriam e até hoje é assim, sofrem menos, pois têm mecanismos que sempre o ajudam a driblar a inflação.

De todos os planos econômicos, o pior foi justamente o Plano Collor, quando o presidente foi eleito com um discurso populista de “caçador de marajás” no seu estado de Alagoas e, por conta desse conto do vigário, venceu a eleição e depois veio a renunciar para não ter seu mandato cassado e perder os direitos políticos.

Atualmente, vivemos um período de 25 anos de controle da inflação, que teve início em 1994 no governo Itamar Franco, que sucedeu Collor e implantou uma nova moeda que passou a ser valorizada no mundo inteiro.

 Nos últimos 02 (dois) anos, tivemos a maior inflação da história em 27 anos, exatamente num governo eleito nas mesmas bases do populismo, da descrença da população nos políticos, que a meu sentir parte da grande mídia tem sua parcela de culpa, pois é bem verdade que o último governo da esquerda foi responsável pelo aumento do nível de corrupção, apesar de ter avançado na execução de políticas públicas sociais, políticas estas que foram determinadas lá atrás pela Constituinte de 1988.

Finalizando, vou traçar um paralelo que afeta a todos, em especial o assalariado e trabalhador autônomo. O nome é “inflação”.

Em 2018 o ano terminou com a gasolina custando na bomba R$ 4,344 e o diesel R$ 3.451; o salário mínimo em 2018 comprava 219 litros de gasolina e 276 litros de diesel, respectivamente.

Passados 3 anos e alguns meses, a gasolina está ao preço médio de R$ 7,73 e o diesel em abril R$ 7,00; com o salário mínimo vigente dá para comprar 156 litros de gasolina e 173 litros de diesel.

Outro item que afeta diretamente a dona de casa, pois todos dependem dele, é o botijão de gás. Em 2018 ele terminou com preço médio Brasil em R$ 70,00 e o salário da época comprava 14 botijões aproximadamente; atualmente o preço médio está R$ 122,00, ou seja, com o salário atual dá para adquirir apenas 10 botijões.

Na última semana, tivemos mais um aumento de combustíveis e “pasmen” ouvimos o presidente fazer uma cena reclamando da Petrobrás por ter aumentado e ao mesmo reclamar do lucro divulgado de R$ 44 bilhões de reais. Ora, apesar de ser economia mista, o controle acionário é do governo. Sendo assim, o presidente pode definir uma política de preços que beneficie a população em geral e não ficar reclamando ou fazendo cena. Não quero aqui partidarizar o debate, apenas tão somente esclarecer alguns pontos. A população merece ser informada e não enganada, para que dessa forma, volte a acreditar na política e nos políticos.

Concluo dizendo que a política em toda sociedade civilizada é necessária e o ato de votar e escolher seus representantes, seja deputado, vereador, prefeito, senador, governador e presidente é de fundamental importância, pois como demonstrado a política tem influência na vida de todos nós.

Por isso, quando vejo alguém dizer que não quer saber de política, fico a me perguntar. Em outras palavras, comungo com parte do pensamento de Bertolt Brecht quando fala do Analfabeto Político ao dizer que “o pior analfabeto é o analfabeto político”. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, da carne, do peixe, da farinha, dos remédios, do aluguel, dos combustíveis, etc., dependem das decisões políticas. Assim como as políticas públicas sociais voltadas para a educação e saúde como demonstrado ao longo do texto, os avanços alcançados, tudo isso dependeu de decisões políticas. Ou seja, uma má escolha vai afetar sua vida ou de sua família no mínimo 4 anos; ou, quando se trata de um governo central, pode ser uma década perdida, devido a responsabilidade que o mesmo tem com a política econômica, monetária e fiscal, e que as vezes é  alinhada aos interesses de grandes grupos corporativos, o que  faz o País retroceder em políticas públicas sociais e privilegiam outros interesses, esquecendo da maioria da população que depende de políticas públicas.

Por tudo isso, sinto-me no dever cívico de não só votar, mas de participar como militante e passar parte do conhecimento que adquiri ao longo da vida prática e na academia, com o objetivo de que, cada cidadão ou cidadã, faça sua reflexão e exerça seu direito de cidadania. Como dizia Winston Churchill: “A democracia é a pior de todas as formas imagináveis de governo, com exceção, às demais que já experimentaram”.

  * É advogado, pós graduado em Direito do Estado.

 

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