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Notícias do Beiju (1576-1928)

O nome do beiju foi grafado pelo colonizador de distintas formas, como soava ao ouvido de cada um

Dr. Francisco José Alves

Departamento de História – UFS

fjalves@infonet.com.br

           O beiju – em sua diversidade– é uma das glórias da culinária nordestina. A iguaria, de origem indígena, logo nos começos da colonização, ganhou o paladar dos europeus e dos mestiços, de reinóis e mazombos, como se dizia à época.

          O nome do beiju foi grafado pelo colonizador de distintas formas, como soava ao ouvido de cada um: beiju, beijuu, beiiu, beju, beyjú. A esta lista, o folclorista Câmara Cascudo (1898-1986) acrescenta mbeiyuemeiu e dá a etimologia do termo: “enrolado, enroscado, franzido, contraído…”.

        Vejamos o que algumas fontes da era colonial, imperial e republicana disseram sobre a célebre iguaria no decorrer do tempo.

            A mais antiga notícia do beiju vem do cronista Pero de Magalhães Gândavo(1540-1580) num texto de 1576. Na obra o autor escreve: “Da mandioca [os índios] fazem outra maneira de mantimento que se chama beijús”.  Tendo em vista o público leitor, Gândavo assemelha o beiju a sobréas e filhós, itens da culinária portuguesa da época.

            Oito anos após o informe de Gândavo, há a notícia dada pelo jesuíta Fernão Cardim (1548-1625). Em Do clima e terra do Brasil…, datado de 1584, o religioso passa em revista a flora e a fauna brasileira. Sobre o beiju, item em foco, informa-nos: da puba se faz a “huns certos beijús como filhós, muitos alvos e mimosos”. Note-se o qualificativo dado pelo jesuíta ao manjar indígena. Mimoso, no português quinhentista como no atual, conota coisa agradável.

            De fins do século 16 vem o informe de Gabriel Soares de Sousa (1540-1591). Em “Notícias do Brasil”, datada de 1587, o sertanista baiano relata: fazem os índios da massa da mandioca “uns filhós a que chamam beijus”. Informa ainda quanto ao modo de preparo: “a massa é disposta no alguidar sobre o fogo”. E compara o beijú brasileiro ao “filhó mourisco” feito em Portugal.

            O frei Vicente do Salvador (1564-1635), nos inícios do século 17, é outro a dar notícia do beiju. Em História do Brasil, finda em 1627, o franciscano baiano informa que da massa da mandioca se fazem “uns bolos delgados […] que se chamam beijus”. O frei arremata com uma apreciação: “é muito bom mantimento e de fácil digestão”. Nascido e criado na Bahia, o religioso, muito provavelmente, falava com conhecimento de causa…

            Do século 18 temos, dentre outros, os registros de um poeta e de um cronista: Manoel Botelho de Oliveira (1636-1711) e Sebastião da Rocha Pita (1660-1738). Oliveira canta o beiju em Música do Parnasso,vinda a lume em 1705. Louvando a mandioca, diz o poeta que dela se faz “o beiju regalado/ que feito tenro/ grande vantagem leva ao pão do trigo”. Educado em Portugal o poeta estava autorizado a fazer tal comparação. Já Sebastião da Rocha Pita fala dos subprodutos da mandioca aí incluindo o beiju. Escreve o cronista que da massa da mandioca fazem os índios “umas delgadas e tênues fatias (…) com nome de beijus”. Não esquece de dizer que o beiju brasileiro supre o “pão de trigo” português.

            No século 19 o beiju é documentado em romances. Neste rol se incluem o Tronco de Ipê (1871), de José de Alencar (1929-1877) e O Cabeleira (1876) de Franklin Távora (1842-1888). Na ficção do século XX, registram o beiju,obras como Luzia-Homem (1903), de Domingos Olympio (1851-1906); Bugrinha (1922) e Sinhazinha (1929) de Afrânio Peixoto (1876-1947). O beiju também comparece na obra famosa de Mário de Andrade (1893-1945), Macunaíma, publicada em 1928. Num dos capítulos do romance, o protagonista, Macunaíma, no dizer do narrador, “passava o dia na rede mastigando beiju”.

Fontes Utilizadas:

CUNHA, Antonio Geraldo da.Dicionário Histórico das Palavras Portuguesas de Origem Tupi. São Paulo: Melhoramentos, 1998. p. 69-70.

CASCUDO, Luis da Câmara. “A Rainha do Brasil”. Em: História da Alimentação no Brasil. 3. ed. São Paulo: Global, 2004. p. 99.

GÂNDAVO, Pero de Magalhães. História da Província de Santa Cruz. São Paulo: Edusp, 1980. Capítulo 5. p. 97.

CARDIM, Fernão. Tratados da Terra e da Gente do Brasil. 3. ed. São Paulo: Editora Nacional , 1978. Do clima e terra do Brasil e terra do Brasil. Capítulo X. p. 45.

SOUSA, Gabriel Soares de. Tratado Descritivo do Brasil. 5. ed. São Paulo: Cia Editora Nacional, 1987. 2ª parte, capítulo 38. p. 174.

SALVADOR, Frei Vicente do. História do Brasil. São Paulo: Melhoramentos, 1975. livro 1º, Capítulo 8. p. 69.

OLIVEIRA, Manoel Botelho. Música do Parnasso. Lisboa: Miguel Menescal, 1705. p.134.

ROCHA PITA, Sebastião da. História da América Portuguesa. Rio de Janeiro: W. M. Jackson, 1950. livro 1º, § 33. p. 15.

ANDRADE, Mario de. Macunaíma. São Paulo: Oficinas Gráficas de Eugenio Cupolo. 1928. Capitulo 10, p. 137.

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