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O São João de Estância, o Barco de Fogo e Chico Surdo

Por Eduardo Marcelo Silva Rocha *

Estância é um dos berços culturais do nosso Estado, conhecida como Cidade Jardim, onde se realiza uma das mais tradicionais festas juninas que se destaca por possuir o maior o Barco de Fogo e os bailes pirotécnicos decorrentes do próprio barco e das espadas e buscapés.

A origem das espadas/buscapés vem do século XIV, no mundo Árabe, sofrendo mudanças em seu emprego e construção, desde o uso bélico (no passado) ao recreativo (atualmente), sendo apenas o rojão (espadas) ou rojão acompanhado de explosão (buscapé).

O nosso Barco de Fogo tornou-se patrimônio imaterial do Estado em 2003 e ganhou oficialmente um dia – o Dia do Barco de Fogo – sendo este o dia 11 de junho. Dia do nascimento de Chico Surdo.

Chico Surdo

Chico Surdo – Antônio Francisco da Silva Cardoso – nascido em 1904, sonhava ser marinheiro, destino comum à época, dos que procuravam uma vida melhor nas comunidades mais pobres da Cidade Jardim. Sonho não realizado devido à deficiência auditiva que, inclusive, carregava referência no apelido.

Irresignado, Chico procurou um ofício e tornou-se jardineiro municipal – guardem esse detalhe – e certo dia decidiu procurar seu barco onde pudesse realizar o sonho de marujar. Daí, Chico aproveitando-se da tradição junina de sua cidade, bolou meticulosamente até conseguir construir um barco movido por espadas e enfeitado com outros artifícios pirotécnicos que funcionariam combinado com o empuxo das espadas. A partir de duas “tesouras” de madeira, esticou um fio de arame capaz de sustentar a viagem do seu barco por dezenas de metros, num espetáculo que se repete há quase 100 anos na terra de Gilberto Amado e Graccho Cardoso.

Na tradição raiz do São João estanciano, que fez o Barco de Fogo ser objeto de atenção nacional, os barcos corriam e eram saudados por buscapés.

O grande momento, que acompanhei a partir dos anos 80, acontecia na Praça da Matriz N S de Guadalupe, no movimento de vai e vem do barco, esperávamos ele ir – cumprindo a primeira parte do trajeto, quando então todos acendiam seus buscapés e, literalmente devido à fumaça, o tempo fechava.

Eram outros tempos, quando íamos de roupa “jeans” molhada propositadamente para assegurar minimamente a perigosa, gratificante e viciante brincadeira. Eita Chico Surdo!

Hoje ou ontem, o Barco de Fogo é a grande vitrine do nosso São João para o Brasil. Lá está ele em posição central no Largo da Gente Sergipana, monumento que consagra as tradições culturais sergipanas.

Como não render homenagens a Chico Surdo?

Mas, o hômi não era mole (como dizemos aqui), criou a grande marca da tradição estanciana, despretensiosamente, enquanto trabalhava tomando conta dos jardins da cidade, com dedicação e compromisso.

Lembram que ele era jardineiro?

Pois bem, segundo as pessoas da época em que ele exercia o ofício, suas podas extrapolavam o ordinário, consistindo em verdadeiras obras de arte, dado seu esmero, cuidado e talento.

Ou seja, Chico Surdo contribuiu não apenas com o Barco de Fogo, mas também no seu ofício ajudou a consolidar a fama de Cidade Jardim em nossa princesa do Piauitinga, com seus belíssimos jardins!

Em reconhecimento ao seu valor, o povo “da” Estância – um grupo de amigos, capitaneado por Reginaldo Lima – resolveu criar uma associação em sua homenagem, culminando na realização do primeiro cortejo do Chico Surdo, em 2019. Tal cortejo, hoje integra o calendário de festas juninas da cidade, realizado no dia de hoje, 11/06.

Enfim, o sonho e o esmero de um homem simples influenciou decisivamente no encaminhamento cultural de uma cidade, seja através do Barco de Fogo ou cuidando dos belíssimos jardins.

É para poucos, e como dizia Nietzsche: ECCO HOMMO.

Fogo no Beco!

* É tenente coronel da PM/SE e membro da Academia Brasileira de Letras e Artes do cangaço. (eduardomarcelosilvarocha@yahoo.com.br)

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