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5 de maio de 2025
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Pedro Barreto de Andrade, promotor público e desembargador

Por Gilfrancisco*

É doloroso escrever sobre um amigo morto. Até porque todos nós sucumbimos um pouco quando os nossos companheiros desaparecem. A solidariedade no desenlace assume então motivações pessoais, eis que a morte extingue a presença amiga e fecha definitivamente a possibilidade do convívio. Acostumamo-nos à vida, crescendo-a permanente com suas expectativas e aspirações e, quando não esperamos, vem um choque violento – a velha Parca ceifa alguém ao nosso lado, advertindo-nos de que há um termo necessário no tempo, inevitável para cada um dos humanos.

Manoel Cabral Machado, Aracaju, 30 de outubro de 1984

Amigo de Manoel Cabral Machado desde a infância, prestou uma homenagem ao escrever um longo e judicioso artigo, marcando os traços fundamentais de sua valiosa existência. Esse artigo foi incluído no livro de Machado, “Brava Gente Sergipana e outros Bravos”, 1999, 2ª edição revista e aumentada, EDISE/TCE, 2016. Filho de Pedro de Andrade, Juiz de Direito de Riachuelo e depois de Simão Dias e de D. Ester Dantas Vieira de Andrade. Pedro Barreto de Andrade nasceu em Simão Dias a 23 de março de 1918, sendo batizado na igreja Matriz em 31 de março pelo Cônego Domingos Almeida.

Com pouco mais de um ano, ficara órfão de pai. A jovem viúva com três filhos menores (Maria Ester, Pedro e Cenira) retorna à Capela, passando a morar com o pai, Dr. Francisco Vieira de Andrade, Juiz de Direito e rico usineiro na Comarca. Fez o curso primário no Colégio Santa Inez, em Capela, dirigido pela professora Adelina da Silva Vieira, concluindo-o em 1928. Neste ano Domo Ester veio morar em Aracaju para melhor educar os filhos. Dois anos depois como interno no Colégio Salesiano encontra o amigo de infância Cabral Machado, mas em seguido, Pedro transfere-se para o Liceu Salesiano do Salvador, onde conclui o 2º e 3º anos ginasiais, vindo a terminá-lo no Colégio Tobias Barreto, dirigido pelo professor Zezinho Cardoso.

Pedro não levava o estudo a sério, sendo seguidamente reprovado nos estudos, fazendo com que seus familiares suspendessem a mesada. Levado pela dificuldade financeira torna-se propagandista de remédios. Anos depois retornou os estudos na Faculdade de Direito do Rio de Janeiro, formando-se finalmente em 12 de dezembro do ano de 1946. A convite do então governador do Estado de Sergipe, Dr. José Rollemberg Leite, retornou para Aracaju, vindo a dirigir, a partir de 30 de dezembro de 1948, o Serviço de Assistência Municipal e no ano seguinte a Imprensa Oficial.

Pedro Barreto de Andrade assumiu vários cargos públicos: Promotor Público de Itabaiana no ano seguinte; 2º Procurador da Fazenda Pública do Estado de Sergipe (1951); Secretário da Justiça e Interior do Estado de Sergipe e Presidente do Conselho Estadual de Serviço Social (1951); Chefe de Polícia do Estado de Sergipe, no governo de Arnaldo Rollemberg Garcez (cargo correspondente a Secretário de Estado da Segurança Pública) (1952); Professor das disciplinas Direto Público e Privado e História das Doutrinas Econômicas, da Faculdade de Ciências Econômicas de Sergipe (1953). Deputado Estadual nas legislaturas de 1954, 1958 e 1962.

Em 1964 Pedro Barreto foi nomeado Desembargador do Tribunal de Justiça de Sergipe, representando o quinto constitucional da advocacia. E preside o mesmo Tribunal em 1973, além de ter presidido o Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe, no biênio 1970 a 1972. Aposentou-se da magistratura em 15 de maio de 1980.

Posse no TJS

Com a presença do Governador Paulo Barreto, autoridades civil e militares, juízes, promotores e advogados, além dos senadores Lourival Baptista e Augusto Franco, o Desembargador Pedro Barreto de Andrade foi empossado em 7 de fevereiro de 1973, na presidência do Tribunal de Justiça de Sergipe. Vejamos o que informa a imprensa local:

Ao transmitir o cargo de Presidente do Tribunal de Justiça ao seu sucessor, o desembargador Prado Vasconcelos apresentou um relatório completo de sua gestão. Linguagem sóbria, elegante e enérgica, expressara a realidade de um Poder, cujo orçamento não correspondia às suas necessidades fundamentais. A dignidade da Magistratura exigira, todavia, uma economia exemplar, a fim de corresponder às reformas físicas e administrativas do Poder, em suas instâncias.

Em seu discurso de posse, que confirmou a sua imagem de magistrado íntegro, estudioso e hábil, o novo presidente do Tribuna de Justiça do Estado, pretende harmonizar o direito positivo com os ditames da moral e dom bem comum:

A solenidade de posse compreendeu ainda a investidura dos Desembargadores Antônio Vieira Barreto e Antônio Xavier de Assis como vice-Presidente e Corregedor Geral da Justiça Sergipana, que juntamente com o novo presidente foram saudados pelo seu colega Dr. Raimundo Rosa, pelo Procurador Geral do Estado, Dr. Eduardo Cabral Menezes, Dr. Antônio Ferreira, Juiz de Direito de Simão Dias, em nome da Associação dos Magistrados de Sergipe, advogados, e promotora Creusa Batalha Figueiredo, representando a Associação do Ministério Público.

Morte na Imprensa

Pedro Barreto de Andrade afirmara-se na vida, sobretudo, como um líder. Por sua inteligência e habilidade, fazia e conservava amigos em qualquer relacionamento, entre ricos e podres. Segundo Manoel Cabral Machado, era homem de caráter e firmeza, sobretudo com muita coragem pessoal e cívica, fez-se respeitado e até temido por pura perversidade, mas porque capaz e se defender e dar dignidade às funções públicas ocupadas.

O deputado Estadual e Desembargador aposentado, Pedro Barreto de Andrade, faleceu na Casa de Saúde São Lucas em 14 de setembro de 1984, deixando viúva, filhos e netos. O sepultamento ocorreu no Cemitério Santa Isabel, com o grande féretro sendo acompanhado por um grande número de pessoas, entre as quais, autoridades, familiares, amigos e ex-colegas.

Durante o velório do Deputado no Plenário da Assembleia, om colega Luiz Machado em nome da Casa, fez a seguinte elegia. Vejamos um trecho:

Deputado Pedro Barreto de Andrade

Vossa Excelência que se acostumou a me ouvir falar de improviso desta tribuna, nos arroubos de minhas orações, neste momento não poderia eu deixar de em nome do Poder Legislativo, saudá-lo pela última vez.

Sinto que a pobreza de meus vocábulos não me permita interpretar as profundas emoções que invadem os corações de todos nós, deputados, seus companheiros e funcionários, seus amigo e admiradores, em suma, do povo sergipano.

Dr. Pedro Barreto

Seus olhos se fecharam, hoje, para este mundo de realidades efêmeras. Seus ouvidos se cerram para sempre ao clamor de nossas vozes. Mas o seu espírito está vigilante.

Vigilante como sempre foi durante a sua vida.

Vigilante porque atento aos problemas do Estado e aos apelos da sociedade sergipana.

Vigilante como atalaia, em defesa e preservação da ordem pública. Guardião da Justiça e baluarte da Ciência Jurídica. Defensor dos direitos humanos dos cidadãos de qualquer categoria social.

São estas as marcas, os estigmas que V. Excelência, Pedro Barreto deixou impressos nas funções que exerceu e nos cargos que ocupou.

Relembrá-lo é evocar um passado honroso e um convívio saudável de um homem público íntegro e de um amigo sincero.

A data 23 de março de 1918 assinalou om começo de sua existência preciosa.

Vocacionado para a vida pública. Exerceu importantes e variados cargos no cenário da magistratura e da política sergipana, em todos se havendo com dignidade e honradez.

Foi Secretário de Segurança Pública non Governo Arnaldo Rollemberg Garcez.

Foi Desembargador emérito.

Presidente do Tribunal Regional Eleitoral, em 1974.

Corregedor Geral da Justiça.

Consolidou sua posição como magistrado emérito e respeitado por todos os sergipanos, exercendo a Presidência do egrégio Tribunal de Justiça do Estado.

Com seu prestígio e diplomacia, soube sensibilizar o Governo na administração José R. Leite para construção do atual Palácio da Justiça.

Foi Secretário de Estado da Segurança Pública pela segunda vez, no Governo do Dr. Augusto do Prado Franco, muito contribuindo para a manutenção da ordem pública em nosso Estado.

Suplente de Deputado, na atual legislatura, o Dr. Pedro Barreto, apesar de seu estado precário de saúde, sempre participou das sessões legislativas. E nunca se omitiu a oferecer sua parcela de contribuição para as decisões deste Poder Legislativo.  (…)

Análise Política

Com a morte do Desembargado aposentado Pedro Barreto de Andrade, que vinha exercendo, o mandato de Deputado, a sociedade sergipana perdeu, segundo correligionários, amigos e pessoas da área, um dos seus mais importantes homens públicos. Pedro sofreu um acidente vascular cerebral (derrame). Levado imediatamente ao hospital, entrou em coma e não resistiu. Vejamos a crônica publicado no Jornal da Cidade. Aracaju, 15 de setembro de 1984:

Difícil formar uma biografia onde ressaltam a imagem do político partidário atuante, e também a figura do magistrado, Pedro Barreto de Andrade, quem ontem faleceu, conseguiu a proeza de deixar marcada a traços fortes na sua vida, a presença participante do cidadão, que vestiu a toga da magistratura, assumindo por isso, a postura serena e grave de quem julga. E ele foi também o parlamentar combativo, tendo atravessado uma das mais duras e atribuladas fases da política sergipana, quando as paixões partidárias com relativa facilidade extravasavam dos debates, da disputa ferrenha pela conquista do eleitor, para assumir características que deram a Sergipe, naquela época; a feição de um Estado violento.

Pedro Barreto de Andrade, com Djenal Tavares Queiroz ne alguns outros, formavam nas fileiras do velho PSD, uma espécie de grupo de “jovens turco”, os que desafiavam as restrições que eram impostas pelo poder quando o partido estava na oposição; os que chegavam primeiro aos locais onde se dizia que o partido não poderia fazer comícios.

Por trás de uma aparência e extremamente metódica e calma, Pedro Barreto tinha uma invulgar energia, uma capacidade de luta somente comparável à sua competência como articulador político, como homem para quem o diálogo era sempre uma forma de convencer e fazer amigos. E com essas qualidades, ele marcou a sua forma muito particular de liderança. Uma liderança que exerceu durante a vida política e que se manifestou também quando como Desembargador, foi no Tribunal de Justiça um dos seus integrantes mais destacados, uma experiência sempre requisitada, e uma inteligência arguta, ágil na descoberta de fórmulas, onde se mostravam compatibilizadas sua sensibilidade política e seu equilíbrio de Juiz.

Pedro Barreto foi por duas vezes Secretário de Segurança, a primeira quando a política sergipana era acirrada e polarizada no Governo Arnaldo Garcez, o primeiro que no PSD elegeu em Sergipe. Depois de passar pela Assembleia Legislativa e chegando a Desembargador nomeado no Governo Celso Carvalho, Pedro Barreto foi novamente Secretário de Segurança no Governo de Augusto Franco, numa fase em que os hábitos da política sergipana haviam sofrido uma transformação quase radical. Ao falecer, ele era outra vez deputado estadual. Como suplente, vinha sempre ocupando uma cadeira com as licenças de Cleonâncio Fonseca e agora de Francisco Passos. Com a morte de Pedro Barreto, desaparece um estilo muito particular de fazer política, uma característica que também parece ter desaparecido quando em 1966 o Ato Institucional nº 2 extinguiu os partidos políticos e em seu lugar criou ficções representadas pela ARENA e MDB.

Opinião dos Amigos

Pedro Barreto sempre foi um político muito inteligente. Desaparece um companheiro que fará muita falta ao Estado de Sergipe.

Augusto Franco

A passagem de Pedro Barreto na vida pública de Sergipe, deve servir de exemplo para as gerações futuras, pelo caráter e pela dedicação com que ele se houve em todos os cargos que exerceu administrativamente ne politicamente.

Reinaldo Moura

Pedro Barreto foi uma das mais importantes figuras que Sergipe teve em todos os setores em que atuou. Grande advogado, juiz exímio e político dos mais combativos.

Guido Azevedo

Pedro Barreto foi, antes de tudo um lutador que desenvolveu seu trabalho com garra e talento. Daí ter se imposto como político, como secretário de Estado e como Desembargador, pois as ações eram pautadas na ordem e na justiça.

Francisco Paixão

*Gilfrancisco é jornalista, escritor, Doutor Honoris Causa concedido pela Universidade Federal de Sergipe. Membro do Grupo Plena/CNPq/UFS e do GPCIR/CNPq/UFS

gilfrancisco.santos@gmail.com

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