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A rua vista da insônia

* Por Amaral Cavalcante

A insônia me leva a esconderijos de onde xereto a vida nos escaninhos da casa.

O cotidiano vai se acomodando pelos cantos

para que a noite atue os seus fantásticos elencos.

 

No lusco fusco da varanda monto guarda aos meus tesouros:

nesga de sanidade mental guardada no velho baú de palavras inconsúteis,

duas ou três metáforas reumáticas

e a fotografia de algum sorriso atônito

amarelando entre mágoas.

 

O chinelo faz gemer os tabuados,

a casa estrala em tremores que vão do rodapé à cumeeira.

É a noite inventando medos, ruidosa

 

O vizinho tosse a mulher ri o filho choraminga a empregada geme no quartinho dos fundos enquanto o pai se masturba no quartinho ao lado.

Uma gata mia entrecortando o cio e logo

o gatão da vizinha espreita a rapariga chorosa no muro baldio.

Vai dar certo!

 

Na rua uma ratazana frinfa o nariz no ar e dá cinquenta e quatro corridinhas para chegar à lata de lixo,

onde uma multidão de baratas faz a festa.

Um lava-cu solitário sobrevoa a sarjeta e pousa elegante na poça,

roçando a extremidade do cu na poça plácida

e um sariguê, roendo cascas de velhos e dourados pomos, de vez em quando me olha com ar concupiscente.

 

O carro corta a mortalha da noite chispando no asfalto

e traz, voando atrás de si, em poeira e ventania,

o lixo das ruas despertas

Cascas de amendoim, pontas de cigarro. latinhas amassadas, filipetas de shows imperdíveis, endereços de amails revelados, miçangas perdidas no frege do amor entre as crianças

e muitos baratões mortos voando em festa,

redivivos no levante dos pneus. (Eus)

 

O dia começou de novo com a sua claridade impune.

* Amaral Cavalcante é jornalista, cronista e poeta de mão cheia

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