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Revisão na biografia de João Bebe-Água

Por Thiago Fragata*

A Mudança da Capital de São Cristóvão para o povoado de Santo Antônio do Aracaju constitui o segundo tema mais estudado na historiografia sergipana, perdendo somente para a questão dos limites entre Sergipe e Bahia. No entanto, boa parte dessa produção pautou-se em discutir a origem e povoamento de Aracaju, o mérito/demérito e acerto/erro do governante Inácio Joaquim Barbosa, o grau de ingerência de João Gomes de Mello, o Barão de Maruim, na decisão política.

Numa perspectiva inovadora para época, 1942, o jovem José Calasans Brandão da Silva apresentou sua tese para concurso à cadeira de História do Brasil e de Sergipe da Escola Normal. Na visão calasiana a decisão teve fatores externos ou nacionais, como a política de conciliação inaugurada pelo Marques de Paraná, a era Mauá e uma mentalidade mercantil. Mas também, apresentou fatores internos ou regionais, como o fato do escoamento da produção taxada na capital São Cristóvão depender das marés do rio Paramopama, afluente do rio Vaza Barris. Sem esquecer que a zona mais próspera da Província chamava-se Cotingüiba e nela se achava assentada a economia sergipana. Em resumo, Calasans atenta para uma tendência nacional de mudar a sede para beira-mar mostrando que Alagoas (1832) e Piauí (1851) fizeram o mesmo naquele contexto.

Vereador, juiz, beato, pesquisas revelam um outro João Bebe-Água. Xilogravura de Nivaldo Oliveira, 2013

Mas falando de João Bebe-Água ou de João Nepomuceno Borges, vejamos o que foi possível apurar nas recentes pesquisas. A primeira etapa da organização do Arquivo da Prefeitura Municipal de São Cristóvão, em 2006, revelou novidades sobre o enigmático sujeito que nos convida a reflexão acerca da visão depreciativa e caricata que ganhou foros de verdade em razão da repetição ao longo do tempo.

Antes gostaria de esclarecer que a intenção aqui não é heroicizar a personagem que vencida pela ação dos adversários políticos – João Bebe-Água era membro do Partido Liberal. Ele viu seu comercio falir, foi rotulado louco, patriota insano, um maltrapilho que morreu sonhando com o retorno da capital a guardar foguetes para estourar nesse dia.

Lembrando conhecido jargão da historiografia francesa “História faz-se com documentos”. Eis que entre papéis antigos do Arquivo da Prefeitura de São Cristóvão descobrimos que o homem simples gozava de prestígio perante a população sancristovense. Era vereador em 1864, cargo não-remunerado naquela época. O termo de sua posse (29/09) informa que João Nepomuceno Borges era vereador re-eleito.1

Ao correr os olhos no citado Livro de Eleições não demoramos a encontrar João Nepomuceno Borges como juiz de paz em 1893. Sabemos que ele não tinha formação em ciências jurídicas, o que não era requisito para o desempenho das atividades inerentes ao cargo, atinente a resolução de problemas da ordem pública e organização das eleições de vereadores e juízes. Manuel dos Passos de Oliveira Teles, juiz de órfãos de São Cristóvão, na época, afirmou ter conhecido João Bebe-Água e garante que ele “não foi louco, não foi um mendigo, era um resignado”.2 Por sua vez, Sebrão Sobrinho, mesmo discordando de Manuel dos Passos em quase tudo, assegura que “João Bebe-Água não foi um tipo à-toa”.

*É especialista em História Cultural (UFS), sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe e Diretor do Museu Histórico de Sergipe.

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