Justiça interdita bar e lava jato
15 de setembro de 2015
CPMF é um roubo
16 de setembro de 2015
Exibir tudo

Lula não é Collor

O que pretende o delegado federal Josélio Azevedo de Sousa, que solicitou autorização ao Supremo Tribunal Federal para ouvir o depoimento de Lula? Admitindo na própria petição que não há provas sobre o envolvimento do ex-presidente no esquema de corrupção da Petrobras, por acaso o policial supõe que Lula vai falar, vai se auto incriminar ou vai deletar alguém? Sabendo-se que essa atitude não é um gesto de ingenuidade, então o que há por trás?

Com razão, o ex-presidente considerou o pedido do delegado ao STF para ouvi-lo no âmbito da Operação Lava Jato uma forma de tentar atingi-lo politicamente. Uma conclusão óbvia, dado o grau de politização das investigações e das manifestações de juízes que já não falam mais somente nos autos, como reclamou o próprio presidente do Supremo, Ricardo Lewandowski.

“A verbosidade de integrantes do Poder Judiciário, fora dos lindes processuais, de há muito é tida como comportamento incompatível com a autocontenção e austeridade que a função exige”, disse Lewandowski num artigo recente, inequívoca indireta ao verborrágico ministro Gilmar Mendes e ao juiz federal Sérgio Moro, herói da vez.

“Posturas extravagantes ou ideologicamente matizadas são repudiadas pela comunidade jurídica, bem assim pela opinião pública esclarecida, que enxerga nelas um grave risco à democracia”, concluiu o presidente do mais alto tribunal.

Mas o que diz o delegado? Atentando para “o aspecto político dos acontecimentos”, o pedido do policial afirma que Lula “pode ter sido beneficiado pelo esquema em curso na Petrobras, obtendo vantagens para si, para seu partido, o PT, ou mesmo para seu governo”. Mas ressalva:

“Os colaboradores Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef presumem que o ex-presidente da República tivesse conhecimento do esquema de corrupção descortinado na Petrobras em razão das características e da dimensão do mesmo. Os colaboradores, porém, não dispõem de elementos concretos que impliquem a participação direta do então presidente Lula nos fatos”.

É argumento jurídico ou retórica política?

E o que busca então o delegado? Apenas empurrar Lula para dentro da Lava Jato, e já preparando o caminho para a aplicação da teoria do domínio do fato, como observou a colunista Tereza Cruvinel. Resumidamente, o delegado diz: ainda que Lula não soubesse, como presidente ele devia saber do que se passava e, portanto, deve ser culpado.

Desde que o PT enveredou pelos mesmos atalhos legais e morais que condenava quando percorridos pelos outros partidos, e após os sucessivos erros políticos e de gestão cometidos pelo governo Dilma, os ânimos ficaram muito exaltados e as pessoas passaram a confundir alhos com bugalhos.

Desde sempre, e agora mais do que nunca, tentam imputar a Lula crimes nunca provados. Na falta de algo de fato incriminador, o pecado normalmente apontado é que ele tem uma doce vida de rico. Viaja de jatinho para fazer palestras pelo mundo e bebe do melhor uísque. Também se diz que ele montou o Instituto Lula para receber dinheiro ilegal, razão da sua fortuna. Entendimento bem diverso, aliás, do que se tem do Instituto FHC.

Parece que o desejo desses é que Lula deveria voltar a ser líder sindical no ABC, ou, quem sabe, a novamente ralar no chão da fábrica onde perdeu um dedo.

Quando não é ele, o filho, Fabio Luís Lula da Silva, o Lulinha, é apontado como um milionário dono da Friboi, dono de grandes áreas de terra e supostas mansões e aviões. Uma das propriedades exaustivamente mostradas na internet é, na verdade, da Escola Superior de Agricultura, de Piracicaba. Um belo casarão, por sinal.

Usada pelos detratores de plantão, até a revista Forbes viu-se obrigada a desmentir que um dia tenha publicado que Lula ou Lulinha sejam bilionários, como se especulou. “Gostaria de destacar que, embora existam alguns bilionários que são políticos, Lula não é um deles. Caso contrário, ele teria, obviamente, que estar presente na lista anual da Forbes”, explicou um representante da revista americana no Brasil.

Desde a campanha passada tentam confundir Lula com Collor, notadamente agora que Dilma Rousseff está na berlinda e ameaçada pelo impeachment. O afastamento dela busca na verdade punir Lula e o PT, mais do que a própria Dilma. O intuito é exonerar os petralhas do poder e decretar a impossibilidade de Lula ser eleito presidente em 2018. Esse é o verdadeiro impedimento legal buscado.

Por isso é tão importante repisar que Collor e Lula são farinha do mesmo saco e que este merece o mesmo destino daquele, ou seja, a execração pública, já que supostamente pego com a mão na botija.

Esquecem que o playboy Fernando Collor, além de ser um corrupto incorrigível, tem um currículo insignificante diante da história do retirante, operário e sindicalista que construiu um partido popular importante, que lutou pela redemocratização, liderou movimentos sociais e realizou um governo que mudou a face do Brasil para melhor, tendo por isso conquistado quatro eleições presidenciais seguidas.

Em momentos distintos ambos foram fenômenos populares, só que Collor, nascido em berço de ouro e debutado na zona sul carioca, foi um salvador da pátria de criação midiática. Lula é um mito forjado a ferro e fogo, moldado nas ruas e temperado nas alterações climáticas da política interna e externa. São matérias bem distintas. Gostem disso ou não.

Marcos Cardoso é jornalista, editor do Caderno Mercado do Jornal da Cidade, e autor de “Sempre aos Domingos: Antologia de textos jornalísticos.

Compartilhe:

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *