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A Constituição é uma quimera?

* Marcelo Rocha

Após as últimas delações premiadas vazadas, o slogan “Diretas Já” voltou à moda.

Há muito – talvez não tanto – a ser debatido acerca desse tema. Mais o que chama a atenção, é a súbita necessidade de respeitar a constituição, que andava tão “esquecida” ultimamente e em um país onde uma turma defende e jura de pé junto que Hitler não era conservador e anticomunista, apesar de acreditar no alemão superior e fazer uma guerra sem prisioneiros com a URSS, debater temas de forma técnica ao invés de ser algo comum, passou a ser algo dramático. (Viramos zumbis?).

Pois bem, como disse, a Constituição andava (descaradamente) meio esquecida de uns 5 anos para cá, quando fomos brindados com tantos fatos metajurídicos, que qualquer estudante Bacharel em  Ciências pode estudar a possibilidade de processar a Universidade que ensinou Ciências Jurídicas, principalmente (bingo) o Teoria Geral do Estado/Teoria da Constituição/Direito Constitucional.

Poderia começar tratando da frase “A Constituição é o que o Supremo diz que ela é”, mas ainda não. Vamos lembrar de outras situações que não parecem reais – que seriam rechaçadas sob total indignação popular.

Ora, no julgamento do mensalão, tivemos uma flexibilização do princípio do juiz natural,  Resumindo, no mensalão do PSDB, os réus sem foro privilegiado foram julgados nos Tribunais de primeira instância, já no mensalão do PT, todos (inclusive os sem foro privilegiado) foram julgados pelo STF. O fato é que se houvesse o fatiamento, os réus não poderiam ser denunciados por formação de quadrilha – os do mensalão do PSDB não foram denunciados por formação de quadrilha, restando um crime de pena amena (provavelmente caixa 2 eleitoral).

O réus do mensalão do PT, foram condenados, na inteligência dos ministros do STF, por motivos e convicções como “a verdade é uma quimera” e “vou condenar sem provas, pois a literatura jurídica me permite”.

Outros pontos podem ser elencados, ainda, durante a Lava Jato de Curitiba, tivemos Condução Coercitiva sem solicitação anterior e recusa, condições essenciais à condução coercitiva. Tivemos mandado judicial de prisão em flagrante (a prisão em flagrante é, exatamente, a única que não precisa de mandado judicial. Pra piorar esse caso, o crime em objeto era afiançável e o réu foi mantido preso…

A esta altura a Constituição de 1988 já respira por aparelhos, em coma.

Mas não se para por ai. Vamos às delações premiadas.

O Primeiro delator, foi o Alberto Youssef, que já havia sido delator nos anos 90, no escândalo do Banestado. Segundo a normatização das delações premiadas, em vigor, ele não poderia ser delator novamente – nem ele, nem ninguém – pois uma das condições do benefício é exatamente não mais cometer crimes… ora, ora. Isso sem falar que, dessa segunda delação (?), ele teve sua pena reduzida de 121 anos para 3 e em regime aberto.

Segundo a norma, as delações nunca poderiam vazar à imprensa, sob pena de nulidade ou oferecer benefício de redução de pena abaixo do previsto na Lei das Organizações criminosas, como ponderou José Joaquim Gomes Canotilho e Nuno Brandão a respeito da legalidade de um proposto acordo de cooperação internacional entre Brasil e Portugal.

Sobram fatos a serem elencados, mas talvez o mais grave de todos, foi o vazamento da conversa da então presidente Dilma com o ex presidente Lula. Primeiro (além do fato de que tais interceptações não deveriam vazar) devido ao fato de que as conversas que vazaram estavam fora do período de tempo permitido pela Lei, deveriam ter sido destruídas, ou seja, nem pra prova serviam, legalmente falando. Segundo, e mais grave, tratava-se de uma conversa privada do Chefe do Poder Executivo Nacional, o que suplanta a pessoa e envolve a segurança nacional do país.

Em uma democracia forte, um fato destes seria entendido como uma ameaça de lesa-pátria.

É importante lembrar que o “impeachment” baseou-se em “pedaladas fiscais”, cometidas igualmente por FHC, Lula e pelo próprio Temer no exercício da presidência. E apesar de serem manobras idênticas, todas foram consideradas regulares, exceto as de Dilma, o que resultou no seu afastamento, em um processo que sempre foi tratado pelos deputados e senadores como um processo político, acima de qualquer técnica, para estancar a sangria, como bem disseram políticos de renome em ligações telefonicas.

Sobre o “impeachment”, é suficiente dizer que até a presente data, não existe nenhuma acusação formal que preencha os requisitos do “Impeachment”. O que corrobora tuo o que foi interceptado pela lava jato, de deputados e senadores dizendo factualmente que “era preciso estancar a sangria da lava a jato”.

Todas as questões acima tratadas apresentam graves violações à Constituição.

Dito tudo isto, reforço minha defesa total à Constituição e às Leis, afinal a sua existência e respeito são os marcos que nos tornam civilizados.

Se a Constituição diz que as eleições devem ser indiretas, não posso defender outra solução. Mas a Constituição diz diversas outras coisas que não estão sendo respeitadas nos últimos anos tudo precisa ser revisto, inclusive o que já foi violado e, principalmente, se os fatos anteriores e presentes se interrelacionam, como o “impeachment”.

Esquecê-los ou ignorá-los é casuísmo. Casuísmo de quem defendeu e vibrou quando a Constituição foi violada, atendendo seus interesses, e agora defende a sua correta aplicação, condenando que haja uma sua ruptura, porque agora também lhe interessa isso.

Casuísmo, oportunismo e desonestidade intelectual? Prefiro crer no desconhecimento da Lei. .

P.S. Interessante lembrar que há menos de 2 anos, Gilmar Mendes e Reinaldo Azevedo eram favoráveis ao vazamento das delações, mas hoje são totalmente contrários.

* Marcelo Rocha é capitão da Polícia Militar de Sergipe.

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